segunda-feira, 25 de novembro de 2013

Taperás


Janete Mehl
           A vida  salta pelos olhos em  encontros e desencontros no cimento que sepulta histórias de bandeirantes, índios caçados, escravos fugitivos e italianos assustados.                         
      Cruzes envolvem as igrejas onde suplico, no meu olhar pagão, em   lágrimas salgadas tão longe do mar,   aprender a pedir sem sentir auto-piedade, 
                                                         Campo das gaivotas | 2004 | 150 x 150 | | acrílica sobre tela -  Janete Mehl

         Idosos sentados  nos   bancos, isolados no meio da multidão,   misturam-se às madeiras descascadas e desbotadas ao observar aquele que os consumem: o tempo de um tempo, que não volta, mas não vai embora...  enrugando a pele, encolhendo os ossos, sombreando artérias.
       O cinza começa a tingir as nuvens, uma aquarela paulista, em preto e branco. A chuva encarde o asfalto e abafa poeiras; as poças d'águas isoladas carimbam o chão, como espelhos sujos e sem molduras, das calçadas que se apagam com pegadas invisíveis pelos pés independentes das pernas que os levam e esperam o sol regressar. 
       Carros desfilam rasgando o asfalto com  água encravada nos sulcos dos pneus,   estampando desenhos abstratos  aos pára-brisas.        Adolescentes histéricos gritam em ordas, num caminho sem caminhos, escravizados pelos teclados de uma melodia virtual, indiferentes aos teimosos taperás que sobrevoam a cotidiana tragédia decretada à natureza indefesa:  espumas  pousadas, coladas, como carma, nas águas densas e grudentas no salto de um Tietê em luto, seguindo o ritmo do prisioneiro que cumpre a sentença dos homens: encarcerado às engrenagens de um relógio mudo,  cujos ponteiros são o perímetro da cidade. 
      A noite abre as cortinas da escuridão para as estrelas saltarem em Salto - que tímido assiste o espetáculo secular, no seu anonimato pulgente que abriga a gente sem nada cobrar.
     

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